Afinal apanhou-me. Não posso dizer que desprevenida, pois afinal fui-lhe deixando a porta aberta negligentemente.
Nego insistentemente a sua existência na minha. Espalho aos quatro cantos do mundo que não a suporto, que a abomino e que assim sendo jamais a deixarei tomar conta de mim. Tenho receio de me embrenhar no calor falso dos seus braços cruzados, porque no fundo a sei forte e tentadora. Sei que se veste de vermelho para disfarçar a "negritude" da sua essência. Conheço-a, a ela e aos seus disfarces, mas sem coragem de a trucidar convido-a a sentar-se no sofá mais pequeno da alma e ela… Ela age em conformidade com o meu prazer e conforto mais terrenos. Tenho a vaga impressão que certos dias até dorme comigo na cama e acorda-me de manhã para ir trabalhar. Dá-me beijos suaves e promete-me amor eterno.
Mas hoje vi-a. Alguém ma denunciou. Ali andava ela a girar em torno de mim, com uma agulhinha fina de linha na ponta, prestes a cozer-me a boca e os membros superiores e inferiores.
Olho-a de frente! Penso: Vou matá-la! Pego na faca afiada! Agora só tenho de conseguir espetar-lha até às entranhas e ficar a vê-la definhar!